segunda-feira, 29 de junho de 2009

KARL MARX E A HISTÓRIA DA EXPLORAÇÃO DO HOMEM

Introdução.

O pensamento sociológico, em seu desenvolvimento, abordou níveis diferentes de realidade. Sabemos que, se iluminarmos uma mesa cheia de objetos com luzes de diferentes cores, partindo de diversos focos, estará produzindo imagens distintas dos mesmos objetos. Nenhuma delas, entretanto, é desnecessária ou incorreta. Cada uma delas “põe à luz” ou privilegia determinados aspectos. Assim também acontece com as teorias científicas e, entre elas, as sociais.
O método positivista expôs ao pensamento humano a idéias de que uma sociedade é mais do que a soma de indivíduos, que há normas, instituições e valores estabelecidos que constituam o social. Weber, por sua vez, reorganizou os fatos sociais “a luz” da história e da subjetividade do agente social.
Agora falaremos de Karl Marx, e materialismo histórico, a corrente mais revolucionária do pensamento social nas conseqüências teóricas e na prática social que propõe. É também um dos pensamentos mais difíceis de compreender, explicar ou sintetizar, pois Marx produziu muito, suas idéias se desdobraram em várias correntes e foram incorporadas por inúmeros teóricos.
Karl Marx (1818-1883) nasceu em Treves na Alemanha, matriculou-se na Universidade de Berlim em 1836 e doutorou-se em filosofia em Lena, em 1845 participou da liga dos comunistas em Bruxelas. Marx também foi um dos fundadores Associação Internacional dos Operários ou Primeira Internacional, suas principais obras foram: A ideologia Alemã, Miséria da filosofia, Para a crítica da economia política, A luta de classes em França e O Capital.

O objetivo de entender o capitalismo

Com o objetivo de entender o capitalismo Marx produziu obras de filosofia, economia e sociologia. Sua intenção, porém, não era apenas contribuir para o desenvolvimento da ciência, mas propor uma ampla transformação política, econômica e social. Sua obra máxima O Capital, destinava-se a todos os homens, não apenas aos estudiosos da economia, da política e da sociedade. Este é um aspecto singular na teoria de Marx. Há um alcance mais amplo nas suas formulações, que adquiriam dimensões de ideal revolucionário e ação política efetiva. As contradições básicas da sociedade capitalista e as possibilidades de superação apontadas pela obra de Marx não puderam, pois, permanecer ignoradas pela sociologia.
Podemos apontar algumas influencias básicas no desenvolvimento do pensamento de Marx. Em primeiro lugar, coloca-se a leitura crítica da filosofia de Hegel, de quem Marx absorveu e aplicou de modo peculiar, o método dialético. Também significativo foi seu contato com o pensamento socialista Frances e inglês do século XIX, de Claude Henri de Rouvroy, ou conde de Saint-Simon (1760-1858), Francois-Charles Fourier (1772-1837) e Robert Owen (1771-1858). Marx desenvolveu o pioneirismo desses críticos da sociedade burguesa, mas reprova o “utopismo” das suas propostas de mudança social. As três teorias criadas tinham como traço comum o desejo de impor de uma só vez uma transformação social total, implantando, assim, o império da razão e da justiça eterna. Nos três sistemas elaborados havia a eliminação do individualismo, da competição e da influencia da propriedade privada. Tratava-se, por isso, de descobrir um sistema novo e perfeito de ordem social, vindo de fora, para implantá-lo na sociedade, por meio da propaganda e, sendo possível, com o exemplo, mediante experiências que servissem de modelo. Com esta formulação, os três desconsideravam a necessidade da luta política entre classes sociais e o papel revolucionário do proletariado na realização desta transição.
Finalmente, há toda crítica da obra dos economistas clássicos ingleses, em particular Adam Smith e David Ricardo. Esse trabalho tornou a atenção de Marx até o final de sua vida.
Essa trajetória é marcada pelo desenvolvimento de conceitos importantes como alienação, classes sociais, valor, mercadoria, trabalho, mais-valia, modo de produção.

A idéia de alienação

Marx desenvolve o conceito de alienação mostrando que a industrialização, a propriedade privada e o assalariamento separavam o trabalhador dos meios de produção – ferramentas, matéria-prima, terra e máquina -, que se tornaram propriedade privada do capitalismo. Separava também, ou alienava o trabalhador fruto do seu trabalho, que também é apropriado pelo capitalista. Essa é à base da alienação econômica do homem sob o capital.
Politicamente, também o homem tornou-se alienado, pois o principio da representatividade, base do liberalismo, criou a idéia de Estado com um órgão político imparcial, capaz de representar toda a sociedade e dirigi-la pelo poder alegado aos indivíduos. Marx mostrou, entretanto, que na sociedade de classes esse Estado representa apenas a classe dominante e age conforme o interesse desta.
Com o desenvolvimento do capitalismo, a filosofia, por sua vez, também passou a criar representações do homem e da sociedade. Diz Marx que a divisão social do trabalho fez com que a filosofia se tornasse a atividade de um determinado grupo. Ela é, portanto, parcial e reflete o pensamento desse grupo. Essa parcialidade e o fato de que o Estado se torna legítimo a partir dessas reflexões parciais – como, por exemplo, o liberalismo – transformou a filosofia em “Filosofia do Estado”. Esse comportamento do filosofo e do cientista em face do poder resultou também na alienação do homem.
Uma vez alienado, separado e mutilado, o homem só pode recuperar sua condição humana pela crítica radical ao sistema econômico, à política e à filosofia que o excluíram da participação efetiva na vida social. Essa crítica radical só se efetiva na práxis, que é a ação política consciente e transformadora.
Com base nesse principio, os marxistas vinculam a crítica da sociedade à ação política. Marx propôs não apenas um novo método de abordar e explicar a sociedade, mas também um projeto para a ação sobre ela.
As classes sociais

As idéias liberais consideravam os homens, por natureza, iguais politicamente e juridicamente. Liberdade e justiça eram direitos inalienáveis de todo cidadão. Marx, por sua vez, proclama a inexistência de tal igualdade natural e observa que o liberalismo vê os homens como átomos, como se estivessem livres das evidentes desigualdades estabelecidas pela sociedade. Segundo Marx, as desigualdades sociais observadas no seu tempo eram provocadas pelas relações de produção do sistema capitalista, que dividem os homens em proprietários e não-proprietários dos meios de produção. As desigualdades são a base da formação das classes sociais.
As relações entre os homens se caracterizam por relações de oposição, antagonismo, exploração e complementaridade entre classes sociais.
Marx identificou relações de exploração da classe dos proprietários – a burguesia – sobre os trabalhadores – o proletariado. Isso porque a posse dom meios de produção, sob forma legal de propriedade privada, faz com que os trabalhadores, a fim de assegurar a sobrevivência, tenham de vender sua força de trabalho ao empresário capitalista, o qual se apropria do produto do trabalho de seus operários.
Essas mesmas relações são também de oposição e antagonismo, na medida em que os interesses de classes são inconciliáveis. O capitalista deseja preservar seu direito à propriedade dos meios de produção e dos produtos e à máxima exploração ao lutar por menor jornada de trabalho, melhores salários e participação nos lucros.
Por outro lado, as relações entre as classes são complementares, pois uma só existe em relação à outra. Só existem proprietários porque há uma massa de despossuídos cuja única propriedade é sua força de trabalho, que precisam vender para assegurar a sua sobrevivência. As classes sociais são, pois, apesar de sua oposição intrínseca, complementares e interdependentes.
A história do homem é segundo Marx, a história da luta de classes, da luta constante entre interesses opostos, embora esses conflitos nem sempre se manifeste socialmente sob a forma de guerra declarada. As divergências, oposições e antagonismo de classes estão subjacente a toda relação social, nos mais diversos níveis da sociedade, em todos os tempos, desde o surgimento da propriedade privada.

A origem histórica do capitalismo

O capitalismo surge na história quando, por circunstâncias diversas, uma enorme quantidade de riquezas se concentra nas mãos de uns poucos indivíduos, que têm por objetivo a acumulação de lucros cada vez maiores.
No início, a acumulação de riquezas se fez por meio da pirataria, do roubo, dos monopólios e do controle de preços praticados pelos Estados absolutistas. A comercialização era a grande fonte de rendimentos para os Estados e a nascente burguesia. Uma importante mudança aconteceu quando, a partir do século XVI, o artesão e as corporações de ofícios foram substituídos, respectivamente, pelo trabalhador “livre” assalariado - o operário – e pela indústria.
Na produção artesanal da Idade Média e do Renascimento, o trabalhador mantinha em sua casa os instrumentos de produção. Aos poucos, porém, estes passaram às mãos de indivíduos enriquecidos, que organizaram oficinas. A Revolução Industrial introduziu inovações técnicas na produção que aceleraram o processo de separação entre o trabalhador e os instrumentos de produção. As máquinas e tudo o mais necessário ao processo produtivo – força motriz, instalações, matérias-primas – ficaram acessíveis somente aos mais ricos. Os artesãos, isolados não podiam competir com dinamismo dessas nascentes industriais e do conseqüente crescimento do mercado. Com isso, multiplicou-se o número de operários, isto é, trabalhadores “livres” expropriados, artesão que desistiam da produção individual e empregavam-se nas indústrias.

O salário

O operário, como vimos, é aquele indivíduo que, nada possuindo, é obrigado a sobreviver da venda de sua força de trabalho e, em troca, paga ao operário uma quantia em dinheiro, o salário.
O salário é, assim, o valor da força de trabalho, considerada como mercadoria. Como a força de trabalho não é uma “coisa”, mas uma capacidade, inseparável do corpo do operário, o salário deve corresponder à quantia que permitia ao operário alimentar-se, vestir-se, cuidar dos filhos, recuperarem as energias e, assim, estar de volta ao serviço no dia seguinte. Em outras palavras, o salário deve garantir a reprodução das condições de subsistências do trabalhador e sua família.
O cálculo depende do preço dos bens necessários à subsistência do trabalhador. O tipo de bens necessários depende, por sua vez, dos hábitos e dos costumes dos trabalhadores. Isso faz com que o salário varie de lugar para lugar. Além disso, o salário depende ainda da natureza do trabalho e da habilidade do próprio trabalhador. No cálculo do salário de um operário qualificado deve-se computar o tempo que ele gastou com educação e treinamento para desenvolver suas capacidades.

Trabalho, valor e lucro

O capitalismo vê a força de trabalho, como mercadoria, mas é claro que não se trata de uma mercadoria qualquer. Enquanto os produtos, ao serem usados, simplesmente se desgastam ou desaparece, o uso da força de trabalho significa, ao contrário, criação de valor. Os economistas clássicos ingleses desde Adam Smith, já haviam percebido isso ao reconhecerem o trabalho como a verdadeira fonte de riqueza das sociedades.
Marx foi alem. Para ele, o trabalho, ao se exercer sobre determinados objetos, provoca nestes uma espécie de “ressurreição”. Tudo o que é criado pelo homem, diz Marx, contém em si um trabalho passado, “morto”, que só pode ser reanimado por outro trabalho. Assim, por exemplo, um pedaço de couro animal curtido, uma faca e fios de linha são, todos, produtos do trabalho humano. Deixados em si mesmos, são coisas mortas; utilizadas para produzir um par de sapatos, renascem como meios de produção e se incorporam um novo produto, uma nova mercadoria, um novo valor.
Os economistas ingleses já haviam postulado que o valor das mercadorias dependia do tempo de trabalho gasto na sua produção. Marx acrescentou que este tempo de trabalho se estabelecia em relação às habilidades individuais medias e às condições técnicas vigentes na sociedade. Por isso, dizia que no valor de uma mercadoria era incorporado o tempo de trabalho socialmente necessário à sua produção.
De modo geral, as mercadorias resultam da colaboração de várias habilidades profissionais distintas; por isso, seu valor incorpora todos os tempos de trabalho específicos. Por exemplo, o valor de um par de sapatos incluí só o tempo gasto para confeccioná-lo, mas também o dos trabalhadores que curtiram o couro, produziram fios de linha, a máquina de costurar, etc.. O valor de todos esses trabalhos está embutido no preço que a capitalista paga ao adquirir essas matérias-primas e instrumentos, os quais, juntamente com a quantia paga ao título de salário, serão incorporados ao preço do produto.
De acordo com a análise de Marx, não é no âmbito da compra e da venda de mercadorias que se encontram bases estáveis nem para o lucro dos capitalistas nem para a manutenção do sistema capitalista. Ao contrário, a valorização da mercadoria se dá no âmbito de sua produção.

A mais-valia

Suponhamos que o operário tenha uma jornada diária de nove horas de trabalho e confeccione um par de sapatos a cada três horas, ele cria uma quantidade de valor correspondente ao seu salário, que é suficiente para obter o necessário à sua subsistência. Como o capitalista lhe paga o valor de um dia de força de trabalho, o restante do tempo, seis horas, o operário produz mais mercadorias, que geram um valor maior do que lhe foi pago na forma de salário. A duração da jornada de trabalho resulta, portanto, de um cálculo que leva em consideração o quanto interessa ao capitalista produzir para obter lucro sem desvalorizar seu produto.
Visualiza-se, portanto, que uma coisa é o valor da força de trabalho, isto é, o salário, e outra é quanto esse trabalho rende ao capitalista. Esse valor excedente produzido pelo funcionário é o que Marx chama de mais-valia.

As relações políticas

Após essa análise detalhada do modo de produção capitalista, Marx passa ao estudo das formas políticas produzidas no seu interior. Ele constata que as diferenças entre classes sociais não se reduzem a uma diferença quantitativa de riquezas, mas expressam uma diferença de existência material. Os indivíduos de uma mesma classe social partilham de uma situação de classe comum, que inclui valores, comportamentos, regras de convivência e interesses.
A essa diferenças econômicas e sociais segue-se uma diferença na distribuição de poder. Diante da alienação do operário, as classes economicamente dominantes desenvolveram formas de dominação política que lhes permitem apropriar-se do aparato do poder de Estado e, com ele, legitimar seus interesses sob forma de leis e planos econômicos e políticos.
Cada forma assumida pelo Estado na sociedade burguês, seja sob o regime liberal, monárquico, monárquico constitucional ou ditatorial, representa maneira pelas quais eles se transformam em um “comitê para seguir negócios comuns de toda burguesia” (K. Marx e F, Engels, Manifesto do Partido Comunista, in cartas filosóficas e outros escritos, p 86.), seja sob regime liberal, monárquico-constitucional, parlamentar ou ditatorial.
Para Marx as condições específicas de trabalho geradas pela industrialização tendem a promover a consciência de que há interesses comuns para o conjunto de classes trabalhadoras e, conseqüentemente, tendem a impulsionar a sua organização política para a ação. A classe trabalhadora, portanto, vivendo uma mesma situação de classe e sofrendo progressivo empobrecimento em razão das formas cada vez mais eficientes de exploração do trabalhador, acaba por se organizar politicamente. Essa organização é que permite a tomada de consciência da classe operaria e sua mobilização para a ação política.

Materialismo histórico.

Para entender o capitalismo e explicar a natureza da organização econômica humana, Marx desenvolveu uma teoria abrangente e universal, que procura dar conta de toda e qualquer forma produtiva criada pelo homem em todo o tempo e lugar. Os princípios básicos dessa teoria estão expressos em seu método de análise – o materialismo histórico.
Marx parte do princípio que a estrutura de uma sociedade qualquer reflete a forma como seus homens organizam a produção social de bens. A produção social, segundo Marx, engloba dois fatores básicos: as forças produtivas e as relações de trabalho.
As forças produtivas constituem as condições materiais de toda a produção. Qualquer processo de trabalho implica: determinados objetos, isto é, matérias-primas identificadas e extraídas da natureza; e determinados instrumentos, ou seja, o conjunto de forças naturais já transformadas e adaptadas pelo homem, como ferramentas ou máquinas, utilizadas segundo uma orientação técnica específica. O homem, principal elemento das forças produtivas, é o responsável por fazer a ligação entre a natureza e a técnica e os instrumentos. O desenvolvimento da produção vai determinar a combinação e o uso desses diversos elementos: recursos naturais, mão-de-obra, instrumentos e técnicas produtivas. Essas combinações procuram atingir o máximo de produção em função do mercado existente. A cada forma de organização das forças produtivas corresponde uma determinada forma de relações de produção.
As relações de produção são formas pelas quais os homens se organizam para executar a atividade produtiva. Essas relações se referem às diversas maneiras pelas quais são apropriados e distribuídos os elementos envolvidos no processo de trabalho: as matérias-primas, os instrumentos e a técnica, os próprios trabalhadores e o produto final. Assim, as relações de produção podem ser, num determinado momento, cooperativas (como mutirão), escravagistas (como na Antiguidade), servis (como na Europa feudal), ou capitalistas (como na indústria moderna).
Forças produtivas e relações de produção são condições naturais e históricas de toda a atividade produtiva que ocorre na sociedade. As formas pelas quais ambas existem e são reproduzidas numa determinada sociedade constituiu o que Marx denominou modo de produção.
Para Marx, o estudo do modo de produção é fundamental para compreender como se organiza e funciona uma sociedade. As relações de produção, nesse sentido, são consideradas as mais importantes relações sociais. Os modelos de família, as leis, a religião, as idéias políticas, os valores sociais são aspectos cuja explicação depende, em princípio, ao estudo do desenvolvimento e do colapso de diferentes modos de produção. Analisando a história, Marx identificou alguns modos de produção específicos: sistema comunal primitivo, modo de produção asiático, modo de produção antigo, modo de produção germânico, modo de produção feudal e modo de produção capitalista. Cada qual representa diferentes formas de organização privada e da exploração do homem pelo homem.
Em cada modo de produção, a desigualdade de propriedade, como fundamento das relações de produção, cria contradições básicas com o desenvolvimento das forças produtivas. Essas contradições se acirram ate provocar um processo revolucionário, com derrocada de produção vigente e a ascensão de outro.

A historicidade e a totalidade

A teoria marxista repercutiu de maneira decisiva não só na Europa – objeto dos primeiros estudos – como nas colônias européias e em movimentos de independência. Organizou os partidos marxistas entre operários – os sindicatos -, levou intelectuais à crítica da realidade e influenciou as atividades científicas de um modo geral e as ciências humanas em particular.
Alem de elaborar uma teoria que condenava as bases sociais da espoliação capitalista, conclamando os trabalhadores a construir, por meio de sua práxis revolucionaria, uma sociedade sentada na justiça social e igualdade real entre os homens, Marx conseguiu, como nenhum outro, com sua obra, estabelecer relações profundas entre a realidade, a filosofia e a ciência.
Por sua formação filosófica, Marx concebia a realidade social como uma concretude histórica, isto é, como um conjunto de relações de produção que caracteriza cada sociedade num tempo e espaço determinados. Foi assim que analisou, em O 18 Brumário de Luís Bonaparte, o golpe de Estado ocorrido na França no século XIX, quando o sobrinho de Napoleão I, parodiou o feito do tio que, em 1799, conseguiu substituir a Republica pela Ditadura.
Por outro lado, cada sociedade representava para Marx uma totalidade, isto é, um conjunto único e integrado das diversas formas de organização humana nas suas mais diversas instâncias – família, poder, religião. Entretanto, apesar de considerar as sociedades da sua época e do passado como totalidades e como situações históricas concretas, Marx conseguiu, pela profundidade de suas análises, extrair conclusões de caráter geral e aplicáveis a formas sociais diferentes. Assim, ao analisar o golpe de Luís Bonaparte, identificam na estrutura de classes estabelecidas na França aspectos universais da dinâmica de lutas de classes.

A amplitude da contribuição de Marx

O sucesso e a penetração do materialismo histórico querem no campo da ciência – política, econômica e social -, quer no campo da organização política, se deve ao universalismo de seus princípios e ao caráter totalizador que imprimiu às suas idéias.
Alem desse universalismo da teoria marxista – mérito que a diferencia de todas as teorias subseqüentes – outras questões adquiriram nova dimensão com os princípios sustentados por Karl Marx. Um deles foi à objetividade cientifica, tão perseguida pelas ciências humanas. Para Marx, a questão da objetividade só se coloca enquanto consciência crítica. A ciência, assim como a ação política, só pode ser verdadeira e não ideológica se refletir uma situação de classe e, conseqüentemente, uma visão crítica da realidade. Assim, objetividade não é uma questão de método, mas de como p pensamento cientifico se insere no contexto das relações de produção e na história.
A idéia de uma sociedade “doente” ou “normal”, preocupação dos cientistas sociais positivistas, desaparece em Marx. Para ele a sociedade é constituída de relações em conflito e é de sua dinâmica que surge a mudança social. Fenômenos como: luta, conflito, revolução e exploração são constituintes dos diversos momentos históricos e não disfunções sociais.
A partir do conceito de movimento histórico proposto por Hegel, assim com do historicismo existente em Weber, Marx redimensiona o estudo da sociedade humana. Suas idéias marcaram de maneira definitiva o pensamento científico e a ação política, assim como das posteriores, formando duas diferentes maneiras de atuação sob a bandeira do marxismo. A primeira é abraçar o ideal comunista, de uma sociedade onde estão abolidas as classes sociais e a propriedade privada dos meios de produção. Outra é exercer a crítica à realidade social, procurando suas contradições, desvendando as relações de exploração e expropriação do homem pelo homem, de modo a entender o papel dessas relações no processo histórico.
Não é preciso afirmar a contribuição da teoria marxista para o desenvolvimento das ciências sociais. A abordagem do conflito, da dinâmica histórica, da relação entre consciência e realidade e da correta inserção do homem e de sua práxis no contexto social forma conquistas jamais abandonadas pelos sociólogos. Isso sem contar a habilidade com que o método marxista possibilita o constante deslocamento do geral para o particular, das leis macrossociais para suas manifestações históricas, do movimento estrutural da sociedade para a ação humana individual e coletiva.

A sociologia, o socialismo e o marxismo

A teoria marxista teve ampla aceitação teórica e metodológica, assim como política e revolucionária. Já em 1864, em Londres, Karl Marx e Friedrich Engels – companheiro em grande parte de suas obras – estruturaram a Primeira Associação Internacional de Operários, ou Primeira internacional, promovendo a organização e a defesa dos operários em nível internacional. Extinguida em 1873, a difusão das idéias e das propostas marxistas ficou por conta dos sindicatos existentes em diversos países e nos partidos, especialmente os social-democratas.
A Segunda Internacional surgiu na época do centenário da Revolução Francesa (1889), quando diversos congressos socialistas tiveram lugar nas principais capitais européias, com várias tendências, nem sempre conciliáveis. A Primeira Guerra Mundial pôs fim a Segunda Internacional, em 1914. Em 1917, uma revolução inspiradas nas idéias marxistas, a Revolução Bolchevique, na Rússia, criava no mundo o primeiro Estado operário. Em 1919, inaugurava-se a Terceira Internacional ou Comintern, que, como a primeira, procurava difundir os ideais comunistas e organizar os partidos e a luta dos operários pela tomada do poder. Ela continua atualmente até hoje, enfrentando intensa crise provocada pelo fim da União Soviética e pela expansão mundial do neoliberalismo.
A aceitação dos ideais marxistas não se restringe mais apenas à Europa. Difundia-se pelos quatro continentes, à medida que se desenvolvia o capital internacional. À formação do operariado no restante do mundo seguia-se o surgimento de sindicatos e partidos marxistas. Os ideais marxistas se adequavam também perfeitamente à luta pela independência que surgia nas colônias européias da África e Ásia, após a Primeira e Segunda Guerra Mundial, assim como à luta por soberania e autonomia, existente nos países latino-americanos.
Em 1919, surgiram partidos comunistas na América do Norte, na China e no México. Em 1920, no Uruguai; em 1922, no Brasil e no Chile; e, em 1925, em Cuba. O movimento revolucionário tornava-se mais forte à medida que os Estados Unidos e a URSS emergiam como potencias mundiais e passavam a disputar sua influência no mundo. Várias revoluções como a chinesa, a cubana, a vietnamita e a coreana instauraram regimes operários que, apesar das suas diferenças, organizavam um sistema político com algumas características comuns – forte centralização e o uso intenso de propaganda ideológica e do culto ao dirigente.

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